Friday, May 27, 2005

Algumas das ideias mais marcantes para mim...

até agora (ainda estou a meio) do livro de José Gil, Portugal, Hoje: O Medo de Existir, Relógio D'Água Editores, 7ª Edição, Março 2005. Recomendo vivamente o livro, é excelente e o Sr. José Gil foi considerado com um dos 20 maiores pensadores vivos, por isso expandam a vossa mente e criem novas perspectivas da vossa realidade!

"(...) muito se herdou e se mantém das antigas inércias e mentalidades da época da ditadura: desde o medo, que sobrevive com outras formas, à «irresponsabilidade» que predomina ainda nos comportamentos dos portugueses. (...) no tempo de Salazar «nada acontecia» por excelência. Atolada num mal difuso e omnipresente a existência individual não chegava sequer a vir à tona da vida. E o que era uma vida, nesse tempo? Aquilo que ditava o ideal moral do Salazarismo: uma sucessão de actos obscuros, com tanto mais valor quanto se faziam modestos, humildes, despercebidos... Onde inscrevê-los, senão na eternidade muda das almas, segundo a visão católica própria de Salazar?
Nisso como em tantos outros aspectos, o Portugal de hoje prolonga o antigo regime. A não-inscrição não data de agora, é um velho hábito que vem sobretudo da recusa imposta ao indivíduo de se inscrever. Porque inscrever implica acção, afirmação, decisão com as quais o indivíduo conquista autonomia e sentido para a sua existência. Foi o Salazarismo que nos ensinou a irresponsabilidade - reduzindo-nos a crianças, crianças grandes, adultos infantilizados." Páginas 16-17

Esta última frase nunca poderia ser mais verdadeira, é o perfeito exemplo da mentalidade do deixar tudo para a última hora e a do "outro": a sida, os acidentes rodoviários, as gravidezes inesperadas, os preservativos rasgados ou furados, a hepatite, etc. acontecem sempre aos outros, nunca a nós ou a culpa é sempre dos outros, nunca nossa. São puramente incapazes de assumir as suas responsabilidades, o que explica, em parte, as taxas de infectados e mortes nas estradas no país.

"(...) a lentidão da «aprendizagem da democracia» (...) pelo povo português. (...) refiro-me ao medo, à passividade, à aceitação sem revolta do que o poder propõe ao povo. Como se, tal como antigamente, a força da indignação, a reacção ao que tantas vezes aparece como intolerável, escandaloso, infame na sociedade portuguesa (tolerado, aceite, querido talvez pela maneira como as leis e regras democráticas se concretizam na sociedade, quer dizer no húmus das relações humanas) se voltasse para dentro num queixume infindável quanto à «república das bananas» ou «a trampa» que decididamente constituiria e essência eterna de Portugal, em vez de se exteriorizar em acção." páginas 39-40

Exemplo disso é a passividade do povo perante a incompetência dos últimos governos, povo que se deixa deslumbrar por Expo's, Euro's e afins e que deixa que a corrupção e incompetência os governe até à falência.

"Porque o 25 de Abril não conseguiu abolir a divisão instruído/sem instrução (concordo totalmente, daí que em Portugal um licenciado é logo o Sr. Doutor ou o Sr. Engenheiro, dono de toda a verdade e sabedoria e se ele diz que é assim, é porque é assim, afinal de contas estudou, mas infelizmente os livros não ensinam a viver e por vezes os "sem instrução" tem tanto para ensinar) que correspondia mais ou menos ao par poder-saber/pobreza-ignorância do tempo do Salazarismo. Porque na sociedade portuguesa actual, o medo, a reverência, o respeito temeroso, a passividade perante as instituições e os homens supostos deterem e dispensarem o poder-saber não foram ainda quebrados por novas forças de expressão da liberdade." página 40

E aqui homenagear Estaline como um herói não é uma expressão da liberdade, mas mais uma vez o exemplo da passividade da sociedade portuguesa perante as instituições e os "homens poder-saber".

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